terça-feira, 18 de setembro de 2007

Saía eu do Angeloni (sempre moro perto dos Angeloni, em toda cidade que passo, vai entender?). Carrinho com meia dúzia de coisas de comer e mais meia dúzia de limpar a casa. Cruzava a porta da frente, após descer a rampinha lateral. Aí, o carrão parou.

Não lembro a marca. Era um banheirão. Um arrojado banheirão preto, encerado e marcado por uma garoa. Estacionou bem na vaga do "carga e descarga". Puxou o freio de mão e abriu a porta.

Eu, instintivamente, sacudi a cabeça e baixei, como quem diz "não, não...". O tiozão saiu do carro. Cabelo duro pra trás, garganteou:

- É carga e descarga, mas eu nã0 vou demorar, viu? Não precisa ficar balançando a cabeça - falou, com sotaque inconfundivelmente carioca. E bateu a porta.

Sorri por dentro. Abri a porta do caroneiro do Mr. Eko e coloquei as compras atrás do banco, bem devagar. Ainda degustava a indignação descabida do lambido quando ele apareceu, lá de trás, gritando de novo. Eu já me dirigia para a porta

- Viu? Eu já voltei. Eu não demorei, disse o cara, com uma sacola (que não era de compras na mão).

Acenei que sim com a cabeça, estendi o polegar. Mas mantive meu risinho nos lábios. Entrei no carro, o homem veio atrás:

- Quem você acha que é pra ficar me tirando assim, hein? Te conheço?

Respondi, ainda sorrindo:

- O meu nome é Rodrigo. E devo ser bem importante pra você dar tanta bola pro que eu penso, né?

Acho que vi fumacinhas saindo da cabeça dele, quando deu meia volta. Eu engatei a ré, depoiis a primeira. Entreguei o cartão do estacionamento e saí, com o cara logo atrás. Acelerava sem estar engrenado. Cruzamos duas esquinas juntos, até que ele quebrou à esquerda e sumiu, acelerando seu possante. Eu ia acenar. Mas não precisou.

Falou!

sábado, 15 de setembro de 2007

Nem tanto

No auge das minhas alegrias efêmeras, acordei assim. Não como ontem, e tomara que nem como amanhã. Vai ver, sonhei que enfiavam lâminas incandecentes entre as minhas unhas e meus dedos, fazendo com que descolassem.

Dói na alma. E logo a alma, que é o segredo do negócio?

Sobra o humor. Não tão refinado. Nem precisa! Por mim, já basta ser divertido.

Dois exemplares de grátis aqui embaixo! Um que sempre me anima, do filme "Segredo da Pantera Cor-de-Rosa". A cena do Steve Martin é impagável. Chego a murmurar "dambãrguer" quando ninguém espera. Arram, atestado de sanidade em dia!




Esse outro é um contrapeso. Tá puto? Ele também! Terça Insana, bem rodado e bem bolado.


sexta-feira, 14 de setembro de 2007

Feliz


Sou suspeito pra falar. Mas fiquei feliz comigo mesmo pelo resultado de um trabalho. Dos melhores que fiz na vida. Uma série de reportagens como todo repórter gosta: com personagens, ambientação, boas histórias e vida.

É a série "7 dias no Paraíso". Na verdade, o bairro mais pobre de Joinville. Morei lá. Ouvi choros, tiros, gargalhadas, xingões e palavras de carinho. Alguns rostos ainda estão muito claros na minha mente.

Mesmo sendo crítico demais comigo, hoje, dois meses após a publicação e A NOTÍCIA, ainda considero tudo super legal. Mesmo imaginando possíveis modificações.

O trabalho virou exposição. Foi primeiro ao bairro, e agora está no shopping cidade das Flores, em Joinville. Então, três vivas para todos os colegas que ajudaram esse pequeno sonho a se tornar real.

Pra terminar, um abraço forte no meu parceiro de jornada: Pena Filho, o brilhante fotógrafo que me acompanhou nessa jornada. O cartaz da foto ganhamos de uma leitora, que acompanhou a série do início ao fim.

Amanhã é folga.
Mas quem disse que eu consigo?

domingo, 9 de setembro de 2007

A Viagem

Resolvemos ir pra Floripa nós cinco. Nunca tínhamos feito isso. Não todos juntos, com o "Mr. Eko", nosso meio de transporte.

O Zeca Baleiro começou cantando. Acho que tava querendo ver qual é a da Ana Carolina:
//Sempre que te vejo assim, linda, nua, e um pouco nervosa...//







O Gessinger tava na frente. Sempre na frente. Uns 200 quilômetros, na bendita highway 101 norte (pra quem tinha que encarar a sul antes... é o céu!). Quase meia noite, mas eu desobedeci o cara. Se ele fez aquela merda com o cabelo, eu faço as minhas também, ué.

Fui só até 110. Porque 120, 160, não pode
E acho que o motor do Eko não agüenta.

O Zeca ainda tava animado, como se cantasse no Baile do Baleiro. "Vamos pra babylon??". Tava tudo na boa. Paramos pra encher o tanque, esvaziar a bexiga e comprar um rufles em Itajaí. Meus caroneiros foram gentis. Não torceram o nariz pro Ômega com cinco cuecas marombados que saiu cavando, com grunhidos saindo da caixa de som estourada.

Tava rolando muito som até os lados de Tijucas. Aí, do nada, a Ana se atravessou. Cortou a minha frente, numa reta quilométrica.
//Hoje eu acordei com sono /com vontade de brigar / Eu tô manero pra bater pra revidar provocação//

E ela mesma pulou pro refrão:
//Hoje você deu azar / hoje você deu azar / de que vale o seu cabelo liso e as idéias enroladas dentro da sua cabeça?//





Aninha foi gente boa. Nem me chamou de careca. Tudo bem que a cabeça tava zonza depois de 14 horas de trabalho. Mas por quê, por quê, Cérebro, você me faz parecer o Pink às vezes?

Quando ela soltou o vozerão, o Zeca e o Gessinger emudeceram. Liguei o pisca, saí do carro na 101 escura. Tava em algum lugar entre Tijucas e Governador Celso Ramos. Longe e tarde demais pra voltar. E enrascado o suficiente pra seguir

Quando arranquei, o pneu cantou, quem berrou fui eu. Descarreguei nos gritos a tensão dos dias, dos últimos e primeiros. Xinguei, chorei de raiva, fiz, eu mesmo, a minha louca tempestade. Aninha nem preciso abrir o bico.

O Zeca se animou:
// Um rio raso, um passo em falso //. Ainda tentou sugerir um atalho, um desvio

E o Gessinger escancarou:
//Eu vejo o horizonte trêmulo / Eu tenho os olhos úmidos

/Eu posso estar completamente enganado / Eu posso estar correndo para o lado errado
/ Mas a dúvida é o preço da pureza / E é inútil ter certeza //






Pois eu tive. Não estava lá no banco de trás. Nem em nenhuma outra parte do carro. Gritei de novo, mais alto que o som do Zeca e a gritaria deles todos na minha cabeça. A maldita tempestade na highway.

Só aí, o Lenine, que tava caladão, tirou o violão e começou a dedilhar. O braço de madeira resvalou na minha nuca, mas eu não liguei. O Filho da mãe fez todo mundo calar a boca, com meia dúzia de acordes. Relutei no começo, mas o cara insistiu, e todos silenciaram, até uma parte mais ou menos assim:

//E a loucura finge que isso tudo é normal / Eu finjo ter paciência
O mundo vai girando cada vez mais veloz
A gente espera do mundo e o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência


Será que é o tempo que lhe falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder/E quem quer saber
A vida é tão rara
Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Mesmo quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei,a vida não para não
. //





O que parou foi o silêncio. Quando o pernambucano fez o bis da letra os outros três cantaram acapela. O Gessinger não quis aparecer, e a Ana não fez falsete. O Baleiro pareceu ter deixado as diferenças entre eles de lado. E o Lenine emendou "A ponte", logo que vi as luzes da Hercílio Luz. Foram cantando eles. Eu só dublei.

E eu, afinal, curti. Liguei o foda-se com um dedo e subi o som com outra.
Ainda deu tempo deles rolarem outras várias. Tudo dentro do Mr. Eko. Até eu, dirigindo e sem habilidade pra cordas, lembro de ter tocado violão, abafado pelas palmas deles. A Ana fez um cafuné rápido que me sacudiu a cabeça, como quem diz "deixa disso, rapá".

Deixei até chegar em casa. Eles ficaram no carro quando minha irmã veio me receber. Aí lembrei de novo do que tinha esquecido. Lenine até solou no violão de novo, mas não me contive. Com sono, puto e com sede, subi. Nem peguei a minha mala, com três pares de sapato, quatro camisetas, uma meia e nenhuma roupa de casamento. Eles se acomodaram no carro mesmo. Já tão acostumados a lugares bem mais estreitos como CDs e DVDs, onde eles moram.


Me convenci de que a culpa não foi minha, não. Foi do Murphy. Tinha que ter o desgraçado do quinto passageiro pra escangalhar a viagem!!!